Limbo previdenciário é o período em que empregador e a Previdência Social divergem a respeito da aptidão do trabalhador para retorno ao trabalho, após afastamento por auxílio-doença. Trata-se de uma “zona cinzenta”, fática e jurídica, em que o trabalhador não recebe salário nem benefício previdenciário.
Em suma, o trabalhador recebe alta médica do INSS, porém o empregador recusa-se a reintegrá-lo em razão de o médico da empresa entender que o empregado é inapto para o trabalho.
Alta médica no INSS
Dito de modo mais específico, a questão assim se apresenta:
Após vencer o período de recebimento do benefício de auxílio-doença, o trabalhador ainda não está apto a retornar ao trabalho e requer prorrogação junto ao INSS. Contudo, mesmo que apresente laudos e exames médicos evidenciando a incapacidade laborativa, o pedido é indeferido porque o perito do INSS entende que o segurado está apto para o trabalho, .
Mesmo sem ter condições clínicas de retornar ao trabalho, o segurado, correndo o risco de agravar sua situação de saúde, apresenta-se ao empregador para retomar suas atividades.
Por sua vez, o médico da empresa considera esse trabalhador inapto para o trabalho, ignorando, portanto, o parecer do INSS.
Essa, pois, a situação de limbo trabalhista e previdenciário:
- para a Previdência Social, o trabalhador não está incapacitado para o exercício de sua atividade, repassando essa responsabilidade ao empregador;
- o empregador, por sua vez, recusa-se a reintegrar o trabalhador, que, submetido à análise do médico da empresa, é considerado inapto para retornar às atividades habituais.
Considere-se que, para o empregador, seria temerário colocar a integridade física do trabalhador em risco, além de assumir responsabilidade por eventual acidente do trabalho.
Do ponto de vista do empregado:
- não há cobertura da sua incapacidade pela Previdência Social, ainda que possua laudo e exame médico atestando o infortúnio, pelo que faria jus não só ao auxílio-doença, mas, eventualmente, à aposentadoria por invalidez;
- seu empregador recusa-se a recebê-lo para retomar suas funções.
Nessas condições, o empregado não recebe remuneração do empregador nem benefício do INSS, restando prejudicado seu sustento e o de sua família.
Limbo Previdenciário: responsabilidade previdenciária e/ou trabalhista
A responsabilidade pela incapacidade laborativa é tanto da Previdência Social quanto do empregador:
- para a Previdência, porque recebe contribuição do empregador e do empregado.
- para o empregador porque usufrui da força de trabalho e percebe lucro pela atividade do trabalhador.
A responsabilidade do INSS não decorre somente das contribuições realizadas pelo empregado, mas, também, pelo valor social do trabalho, constitucionalmente garantido (art. 5º, V, da CF/88).
A prática tem demonstrado que o indeferimento de benefícios pela Previdência Social talvez venha atender a questões de política administrativa, ou seja, imposição de “limites” para concessão de benefícios.
Por parte do empregador, o risco é duplo: se por um lado, pode agravar a situação do segurado determinando seu retorno ao trabalho, por outro, pode estar sujeito a demandas judiciais por direitos trabalhistas ou reparação de danos por acidente laboral.
Medida paliativa seria readaptação do trabalhador em outra função, se possível, mas essa hipótese raramente ocorre na prática.
Do ponto de vista do trabalhador, a hipótese em questão é passível de gerar uma série de danos: sem receber salários, todo o seu projeto de vida é minado, causando-lhe danos materiais, morais e existenciais.
Limbo Previdenciário: questões processuais
Há três possíveis medidas que o trabalhador pode adotar:
a) pedido judicial de benefício por incapacidade contra o INSS, com pedido de tutela antecipada;
b) ação trabalhista em face do empregador, pleiteando pagamento dos salários entre o período da alta do INSS e a recusa do empregador em admitir o retorno às funções ou em readaptação;
c) ação trabalhista em face do empregador, pleiteando reparação de danos, pelos mesmos motivos do item anterior (ambos os pedidos podem ser cumulados ou sucessivos).
Os tribunais vêm entendendo que cabe ao empregador reintegrar o empregado, pagando-lhe respectivos salários, considerando, portanto, que o laudo médico do INSS deve prevalecer sobre o laudo do médico do empregador (ou do médico particular), com fulcro, especialmente, na presunção de legitimidade do ato administrativo.
Competência processual para conhecer do limbo previdenciário
Em relação à competência processual, há duas possibilidades para o trabalhador:
- pleitear na Justiça Federal respectivo auxílio-doença;
- na Justiça do Trabalho, pode pedir os salários do período de “limbo”.
Questão complexa é saber se essas duas possibilidades podem ser concomitantes ou excludentes, embora uma não vincule a outra.
O fato é que ambas as Justiças poderão dar respostas conflitantes, até porque haverá distinta perícia médica.
É coerente com o art. 114, IX, da CF/88 o entendimento de que a competência processual, no caso, seria exclusiva da Justiça do Trabalho, porque se trata de relação jurídica decorrente do contrato de trabalho.
O tema não é de todo estranho ao processo do trabalho, diante do disposto no art. 114, VIII, da CF, que determina competência da Justiça do Trabalho para “a execução, de ofício, das contribuições sociais previstas no art. 195, I, a, e II, e seus acréscimos legais, decorrentes das sentenças que proferir”.
A lógica é a mesma para ambas as hipóteses: obrigação decorrente do contrato de trabalho.